terça-feira, 12 de junho de 2007
EMANCIPAÇÃO DE PAULO AFONSO
NOSSA EMANCIPAÇÃO
Euclides Batista Filho
A conjuração pela emancipação de Paulo Afonso começou efetivamente em março de 1952, quando o pernambucano Abel Barbosa e Silva, chefe de escoteiros, convidou alguns amigos para uma secretíssima reunião. Ao ser convidada, a comerciante Risalva Toledo questionou Abel sobre o motivo do encontro, recebendo a resposta de que somente ficaria sabendo quando comparecesse à reunião marcada para a residência do comerciante Luiz Inocêncio de Lima, às dez horas daquela noite. A assembléia histórica aconteceu na penumbra silenciosa da cozinha do Sr. Luiz Inocêncio, onde um candeeiro substituía as lâmpadas apagadas. Lá estavam então dona Risalva Toledo, Luiz Inocêncio, Abel Barbosa (conhecido como Chefe Abel), João Vicente Ferreira (conhecido como João Sapateiro), João Francisco da Silva (conhecido como João Marceneiro), Antônio Patrício, Francisco Domingos, Altino Gomes (cunhado de Zé Lima), José Aquilino, José Neto, Antônio Neto e Manoel Neto. O sigilo tinha que ser total. Paulo Afonso pertencia a Glória e sua emancipação política contrariava interesses da pequena cidade que não queria perder os impostos do jovem e rico distrito. Como a independência contrariava também interesses da Chesf, nossos heróis corriam muitos riscos, inclusive de vida. Conta Dona Risalva: "Chefe Abel por exemplo, foi abordado por um pistoleiro de aluguel quando comprava ingresso na bilheteria do cinema (atual Caixa Econômica). Estava agarrado com a arma do bandido, em luta corporal, quando o adolescente Josias, seu afilhado e irmão de Xerém, estando no salão de sinuca ao lado, correu em seu auxílio com o taco de jogo. Desferindo violentíssimo golpe na cara do facínora fraturou-lhe o nariz, na maior tacada de sua vida. Aquele não seria o único atentado e todo cuidado seria pouco ".
Como líder do grupo, Abel advertia sobre os perigos a que todos estavam sujeitos, ouvindo dos amigos o compromisso de total e irrestrito apoio à nobre causa, acontecesse o que acontecesse. Assim, aos cochichos e na semi-escuridão, nossos conspiradores lançavam a semente da nossa liberdade, trabalhando para que germinasse. Como parte desse trabalho, Dona Risalva contactava secretamente as mulheres da Vila Poty, para que elas conquistassem a adesão dos maridos, fazendo o movimento crescer em número e importância. As reuniões continuavam acontecendo sob o mais absoluto segredo e nos locais mais diversificados, com o número de simpatizantes aumentando a cada dia. Contudo, alguns adeptos sofriam as mais diversas represálias, inclusive perdendo seus empregos na Chesf, como Zezito do Fórum, Gilberto Leal, etc. Porém, nada os fazia recuar.
Em 1º de maio de 1954, dia do trabalhador, Abel Barbosa, então vereador de Glória, em palanque armado na Rua da Frente (atual Posto Oásis) lançou publicamente a campanha pela emancipação política de Paulo Afonso. Diz Dona Risalva: "A luta cresceu, a perseguição também, mas o desejo de ver Paulo Afonso livre nos dava mais garra e disposição. As pressões aumentavam, pois os adversários viam em nós uma grave ameaça aos seus interesses. Quanto mais faziam oposição, mais trabalhávamos com impressionante coragem".
Em abril de 1955, início de legislatura, o vereador Abel apresentou na Câmara de Glória a proposta de desmembramento de Paulo Afonso. Como naquela casa a matéria era apoiada apenas por Abel e pelo vereador Moisés Pereira, o obstáculo era intransponível. Como a luta prosseguia, no segundo semestre de 1956 o vereador Abel conseguiu o valiosíssimo apoio do vereador Manoel Moura, líder do prefeito de Glória, que por sua vez convenceu outros vereadores, sendo o projeto de emancipação aprovado em 10/10/1956. Narra Antônio Galdino: "No plenário da câmara municipal de Glória, debates, apartes e questões de ordem. Na ordem do dia projeto-de-lei do vereador Abel Barbosa, propondo a separação política de Paulo Afonso. Várias vezes, no calor das discussões, madrugada adentro, parava-se tudo para socorrer o vereador Moisés Pereira que, muito doente, fez questão de estar presente na discussão da importante matéria. No final do debate o seu voto foi decisivo, completando o número necessário para que Paulo Afonso tivesse vida própria. A centenária Glória perdia seu mais importante distrito". O vereador Moisés Pereira faleceria poucos dias depois. O projeto foi encaminhado à Assembléia Legislativa em Salvador, onde foi apoiado pelos deputados Otávio Drumond e Clemens Sampaio. Enfim, depois de cumpridas todas as formalidades legais, o governador Antônio Balbino de Carvalho Filho sancionou a Lei nº 1.120 em 28/07/1958, que tornou Paulo Afonso independente.
A notícia da emancipação estourou como uma bomba de indescritível alegria. Em palanque armando no mesmo local do lançamento oficial em 1954, aguardava-se o Chefe Abel que vinha de Salvador. Enorme caravana dirigiu-se ao povoado Riacho para receber o libertador de Paulo Afonso, que, sobre um jipe aberto, entrou na CIDADE ovacionado e acenando com o Diário Oficial. Ao subir no palanque que o aguardava, com a voz embargada por fortíssima emoção, apenas conseguiu dizer: "Pauloafonsinos, eis o meu e o vosso sonho de liberdade realizado". Inflamados oradores fizeram apaixonados discursos, dentre os quais, José Rudival de Menezes e José Freire (do abrigo).
Muito emocionada, como se um filme estivesse passando em sua memória, Dona Risalva Toledo, heroína da nossa liberdade, afirma hoje: "Somente Deus pode avaliar o tamanho da alegria que sentimos todos, especialmente eu. Palavras não expressam... ". Ela estava lá.
Na Rua da Frente, de um lado só, o comércio. Na sorveteria de Mestre Brito, picolé de arroz e intermináveis histórias da época de marinheiro, caprichosamente narradas no linguajar perfeito da grande intimidade com a gramática portuguesa. No cinema de "seu" Noé, inesquecíveis seriados nas matinês da vida, Ninoza na bilheteria, Zezinho operando a máquina, Tupã alugando gibís a quinhentos réis. Na Sorveteria Botijinha, o inconfundível picolé de côco de João Mariano. Pedrinho da Triunfante, Dona Zefinha, Casa Andrade, Casa das Linhas, Joaquim do Doce, no Mundo das Novidades, de dona Risalva, o maior sortimento. Zé Miron e "seu" Teixeira, os primeiros fotógrafos. Para os pés, calçados de "seu" Lúcio, "seu" João Vicente e Bacôca. Na Sorveteria Vitória, a cerveja gelada de "seu" Artur Freire, com direito ao desafinado samba-de-breque de Amaro Mansinho. No abrigo, o delicioso doce de leite do vereador de Zé Freire, sem igual.
Na Praça 7 de Setembro, perto da Rua das Flores, o Chafariz 1, zelado pelo velho André. Abastecendo as pobres casas das proximidades, mulheres e crianças com suas latas d’água em cabeças e galões. Bem ao lado, o Posto Médico do Estado e seu sempre elegante enfermeiro Hortêncio, marido de Dona Rosa, pai de Carlos, Cauby, Iracema e Paulo. Um pouco mais acima, o cabaré ou mangaratiba: Pombinha, Coca-cola, Guilhermina, Maria Cavalcante, Maria José, Dulce, Carmem Miranda e tantas outras mulheres da vida.
Nas Escolas Murilo Braga (Carlina) e Adozindo Magalhães (IEPA), Dona Eunice, Dona Zélia, Dona Amanda, Dona Amélia, Dona Mônica, Dona Elvira, Dona Conceição e tantas outras mestras, verdadeiras mães e sacerdotisas do ensino numa época em que a educação era tratada com respeito. No Ginásio Paulo Afonso (COLEPA), Dona Neide de Dr. Cerqueira e Pimentel, que se emocionava ao ouvir Cisne Branco. Dona Etelinda do admissão, Cláudio Melo do inglês, Cerqueira Lima da matemática, Dr. Orlando Passos, das ciências. Quanta saudade, minha cidade! Na Poty, o Grupo de Escoteiros Rui Barbosa. Jogos, instruções, ordem-unida, acampamentos. Garbosos desfiles em datas cívicas, que a todos encantava por onde passava, engalanado no uniforme impecável, na cadência pioneira de sua banda marcial. Pereira, Manoel Barros, Arnaldo Aderino, Euclides Alves, Washington, Gerônimo, Zito Pinheiro, Ivinho, Zé Raimundo, Índio, Xerém, Josias, Luiz Gonzaga, Valdenor Vilar, Zé Vieira e outros adolescentes comandados por Chefe Abel.
E o futebol, minha cidade? Foi o melhor de toda tua história, com a primorosa seleção que só não ganhava de Santana do Ipanema: Tota, Borboleta, Nilsinho, Geninho, Vadinho, Chicão, Mormaço, Monte, Bahia, Farmácia, Boi, Inseto, Gaguinho, Dito, Carreteiro, Sebinha, João Doido, etc., dirigidos por Peri-Peri e protegidos por Álvaro de Carvalho. Equipes como Redenção, Brasil, Olímpico, Copa, Dínamo, Kilowatt, faziam a festa das tardes dominicais, na poeira do campo careca e cercado de ripas de madeira, hoje Ruberleno. Quantas glórias, minha cidade!
Nos teus clubes de então, os casais enamorados dançavam abraçados, rosto no rosto, ao som da música romântica de Turpim, Expedito, Gilberto, Lalau, Nequinho, Nelson, Enaldo, Sabino, Cláudio, Chumbinho, Dudu, Zé Laiete, etc. Em datas e momentos especiais a banda de música da CHESF soltava no espaço os mais belos dobrados do seu repertório, sob a batuta do Mestre Sebastião, que regia os excelentes artistas.
Ah, minha cidade! Nas tuas descalças e tortuosas ruas, janelas abriam-se nas madrugadas, emoldurando rostos de mulheres embevecidas pelos acordes românticos das canções de amor, nas serenatas que vozes apaixonadas e plangentes violões lhes ofereciam. Era o amor, minha cidade, que ainda existia no coração das pessoas, numa época em que homem era para mulher e mulher era para homem.
Nas festas natalinas, minha cidade, tu te dividias em dois partidos: o encarnado e o azul. E nós éramos constantemente abordados pela graça ingênua das meninas pastorinhas de ambos os cordões, que colocavam em nossas lapelas o lacinho de fita rubro ou celeste. Nos leilões arrematávamos os mais diversos. Na Poty, o Grupo de Escoteiros Rui Barbosa. Jogos, instruções, ordem-unida, acampamentos. Garbosos desfiles em datas cívicas, que a todos encantava por onde passava, engalanado no uniforme impecável, na cadência pioneira de sua banda marcial. Pereira, Manoel Barros, Arnaldo Aderino, Euclides Alves, Washington, Gerônimo, Zito Pinheiro, Ivinho, Zé Raimundo, Índio, Xerém, Josias, Luiz Gonzaga, Valdenor Vilar, Zé Vieira e outros adolescentes comandados por Chefe Abel.
E o futebol, minha cidade? Foi o melhor de toda tua história, com a primorosa seleção que só não ganhava de Santana do Ipanema: Tota, Borboleta, Nilsinho, Geninho, Vadinho, Chicão, Mormaço, Monte, Bahia, Farmácia, Boi, Inseto, Gaguinho, Dito, Carreteiro, Sebinha, João Doido, etc., dirigidos por Peri-Peri e protegidos por Álvaro de Carvalho. Equipes como Redenção, Brasil, Olímpico, Copa, Dínamo, Kilowatt, faziam a festa das tardes dominicais, na poeira do campo careca e cercado de ripas de madeira, hoje Ruberleno. Quantas glórias, minha cidade!
Nos teus clubes de então, os casais enamorados dançavam abraçados, rosto no rosto, ao som da música romântica de Turpim, Expedito, Gilberto, Lalau, Nequinho, Nelson, Enaldo, Sabino, Cláudio, Chumbinho, Dudu, Zé Laiete, etc. Em datas e momentos especiais a banda de música da CHESF soltava no espaço os mais belos dobrados do seu repertório, sob a batuta do Mestre Sebastião, que regia os excelentes artistas.
Ah, minha cidade! Nas tuas descalças e tortuosas ruas, janelas abriam-se nas madrugadas, emoldurando rostos de mulheres embevecidas pelos acordes românticos das canções de amor, nas serenatas que vozes apaixonadas e plangentes violões lhes ofereciam. Era o amor, minha cidade, que ainda existia no coração das pessoas, numa época em que homem era para mulher e mulher era para homem.
Nas festas natalinas, minha cidade, tu te dividias em dois partidos: o encarnado e o azul. E nós éramos constantemente abordados pela graça ingênua das meninas pastorinhas de ambos os cordões, que colocavam em nossas lapelas o lacinho de fita rubro ou celeste. Nos leilões arrematávamos os mais diversos brindes, doados por comerciantes: frango assado, bolo, brinquedos, roupas, sapatos e as mais curiosas coisas. Ao longo da avenida empoeirada, roletas, pescarias, bebidas, comidas, barracas que tinham os mais variados nomes: Campeão do Mundo, Bossa Nova, Sputinick, Banho de Lua, Balada Triste. Nos alto-falantes, Nelson Gonçalves, Ângela Maria, Anisio Silva, Orlando Dias, Agostinho dos Santos, Cely Campelo, Carlos Gonzaga, Brenda Lee, Elvis Presley, etc. Das festas juninas e dos carnavais, é melhor nem falar, minha cidade.
A comunicação ficava por conta da Difusora Miramar, que além de chamadas de correspondências por Salvino, tinha até novelas interpretadas por Ednaldo Francisco, Luiz Martinelli, Edson Araújo, José Rudival e musicais oferecidos de alguém para alguém, com muito amor e carinho. Na clandestina Rádio Poty, de Roque Leonardo, o esporte com Erundino Viana e o romantismo das poesias narradas por Mário Santos. Como esquecer, minha cidade, Gilberto Leal e a Voz do Povo? Impossível.
Como esquecer tantas outras coisas tuas? Dr. Souza, Otaviano Leandro, Júlio Valentin, Noé Pires, Dr. Muccini, Pastor Onésimo, Padre João, Dona Lóide, Fedegoso, Mané-Perna-Torada, Horácio, Maria-Sete-Molas e teus laboriosos cassacos construindo o teu progresso?! Chafarizes 2 e 3, casas de tábuas, cadeia de pedras, a Vila Operária, suas guaritas e seus pivôs. Impossível conter a emoção, minha PAULO AFONSO.
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